
O direito sucessório português é frequentemente buscado por estrangeiros e residentes não habituais que têm bens em Portugal ou familiares falecidos no país. Em um contexto de crescente mobilidade internacional e aquisição de imóveis por cidadãos de outras nacionalidades, entender como funcionam as regras de herança em Portugal é essencial para garantir segurança jurídica e proteção patrimonial.
Neste artigo, exploramos os principais aspectos legais da sucessão hereditária portuguesa, com foco nas regras aplicáveis a estrangeiros, residentes não habituais e pessoas com dupla nacionalidade.
A lei aplicável à sucessão: nacionalidade ou domicílio?
Portugal adota o princípio da lei da nacionalidade do falecido como critério de definição da lei aplicável à sucessão. Contudo, desde 2015, com a entrada em vigor do Regulamento Europeu (UE) n.º 650/2012, as regras foram harmonizadas para os Estados-Membros da União Europeia (com exceção da Dinamarca e Irlanda). Este regulamento estabelece que:
- A sucessão será regida pela lei do país da residência habitual do falecido no momento da morte;
- O falecido pode optar, em testamento, pela aplicação da lei da sua nacionalidade.
Assim, um cidadão brasileiro residente em Portugal pode, por testamento, optar pela aplicação da lei brasileira à sua sucessão, ou, se nada dispuser, será aplicada a lei portuguesa.
A legítima hereditária e a liberdade de dispor
O sistema português adota o princípio da reserva de legítima, ou seja, parte do patrimônio do falecido obrigatoriamente pertence a determinados herdeiros (cônjuge, descendentes e ascendentes).
A divisão dos bens obedece à seguinte lógica:
- 1/2 da herança é destinada obrigatoriamente aos herdeiros legitimários;
- A outra metade pode ser livremente disposta por testamento (parte disponível).
Isso significa que, mesmo com testamento, o falecido não pode excluir totalmente os herdeiros necessários.
Quem pode herdar em Portugal?
Podem herdar, com base na lei portuguesa:
- Cônjuges ou unidos de facto, desde que legalmente reconhecidos;
- Descendentes diretos (filhos, netos);
- Ascendentes diretos (pais, avós), na ausência de descendentes;
- Outros parentes ou herdeiros testamentários, conforme a ordem legal ou disposições de testamento.
Importante destacar que herdeiros estrangeiros não perdem o direito à herança, desde que cumpram os requisitos legais para aceitação e partilha de bens em Portugal.
Regime fiscal e tributação da herança
Portugal não cobra imposto sobre herança para cônjuges, filhos e netos. No entanto, outros herdeiros estão sujeitos ao Imposto do Selo, com alíquota de 10% sobre o valor dos bens recebidos.
Esse imposto incide, sobretudo, sobre:
- Imóveis localizados em território português;
- Saldos bancários e valores mobiliários em contas portuguesas;
- Outros bens sujeitos a registro em Portugal (ex: veículos).
Herança e residentes não habituais (RNH)
O estatuto de Residente Não Habitual (RNH) não altera as regras sucessórias, mas pode ter impacto nos rendimentos futuros derivados da herança, como rendimentos de imóveis ou aplicações financeiras.
Contudo, os RNH continuam sujeitos à legislação portuguesa quanto à aceitação da herança, nomeação de cabeça-de-casal, avaliação e registo dos bens herdados em Portugal.
O papel do advogado na sucessão internacional
A presença de um advogado com experiência em direito sucessório internacional é fundamental em casos que envolvem:
- Herdeiros de diferentes nacionalidades;
- Bens em múltiplas jurisdições;
- Dificuldades na obtenção de certidões e documentos no exterior;
- Necessidade de abertura de inventário judicial ou extrajudicial em Portugal.
O profissional pode auxiliar na comunicação entre os herdeiros, elaboração do testamento, intermediação junto a cartórios e tribunais, além de garantir a correta distribuição do patrimônio.
Conclusão
Entender as regras da herança em Portugal é essencial para estrangeiros e residentes não habituais que possuem bens no país ou têm laços familiares com cidadãos portugueses. Com a harmonização europeia e a presença cada vez mais comum de famílias binacionais, o planejamento sucessório é uma medida inteligente para evitar conflitos futuros e proteger o patrimônio familiar.